Tu, de novo. Eu sem saber como se faz para sorrir, o tempo desaprendeu-me, o coração enterrado perto do banco do jardim ficou-me com o sangue que me daría a força para arquear os lábios, tingi-los da vida que agora preciso para me poderes ver. Tu, outra vez e a sorrir para mim. Tento recordar-me como se faz para mostrar um sorriso mas quando a lembrança volta já tu partiste. Sorrio ao ver as tuas costas a afastarem-se.
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Como era feliz quando ignorante achava o plano dos sonhos o fio que me havia de levar, sem perder, à concretização do meu amor por ti. Eram esboços do que havería de ser a obra principal. Não sei quando, esse fio libertou-se da minha mão, fiquei sem saber como chegar aos sonhos, perdi-me. E neste estado, sem viver e sem sonhar, acharam-me alma penada, levaram-me antes do tempo.
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Por andar tão curvada vejo melhor a ponta dos meus passos. E admiro-me, de ensinados que estão na trilha de caminhos sempre conhecidos, não me obedecerem a mudar a direcção. Fatalmente. Porque me levam, penosos, a viagens de sons e imagens em que tu apareces, em que eu ainda sonhava com beijos que me pudesses dar. Peço aos passos que parem, mas lestos encaminham-se no conforto do espaço onde a memória lembra tempos felizes.
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Sinto um peso nas costas, todo o chumbo que se me agarrava ao peito e me fazía curvar, apoiou-se sobre os meus ombros, a nuca. É uma força brutal que me carrega para baixo. Talvez a culpa seja minha, deverá esta ser a sensação dos condenados, clamarem a sua inocência e nos olhos dos outros ver o espelho dos seus crimes. O meu sabes bem qual é. E carrega-me, quase me sepulta.
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Vi-te. Tu também, disseste adeus e com um grande sorriso. Depois seguiste caminho. Livre como se não fosses culpado de nada.
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©opyright Escritos Nefastos, Maria Manuel Gonzaga, 2009-2016