Bateste à minha porta de olhos baixos, um pedido de desculpa nos olhos baixos, mas nos lábios um silêncio trocado por conversa miúda. E eu à espera que me dissesses a verdade. Mas tu nada disseste. Não sei porque falei ou se terá sido o fantasma de mim que abriu a boca e a voz saíu. Sem rodeios confessei o meu amor por ti. Os longos anos em que te procurei, todo o tempo em que sofri calada ao ver-te beijar outra, outras, quando te amava. A esperança, por cada vez que te aproximavas ou me falavas ou até o toque da mão nas minhas. A lembrança de um dia junto ao mar a recolher uma lágrima, não te recordas. Mas agora, não mais.
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Não volto mais ao nosso jardim, ao nosso banco. Ali, perto dele e junto à árvore, enterrei o meu coração. Não fica bem visitar a lápide de nós próprios. Fico por casa. Hei-de por aqui vaguear como um fantasma do que já fui, visitar o quarto da que fui e da que sonhei, quando achava que havia esperança de que um dia me olharías e verías a diferença de um verdadeiro amor. Não mais, não mais.
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Calhou estar ali sentada, no nosso banco, e tu passares com outra. Sei que me viste. Até olhaste uma segunda vez. Deste a mão a essa que contigo acompanhava e apressaste o passo. Senti que as minhas pernas queríam correr, mas o coração enterrou-se junto à árvore que me dava sombra e assim, sem sangue que desse combustível para me activar, não me mexi. Fiquei a ver-te as costas até me doerem os olhos e vez nenhuma te voltaste para ver se eu estava aqui.
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©opyright Escritos Nefastos, Maria Manuel Gonzaga, 2009-2016